Economia

Reforma gráfica do 'Jornal do Brasil' nos anos 50 e criação do Caderno B influenciaram a ...

RIO - Impulsionado pelos bons ventos do pós-Guerra, o Brasil entrava nos anos 50 apostando na prosperidade. Nesse clima de euforia, os poetas concretos abalaram as estruturas da literatura, decretando o fim do poema, ao mesmo tempo em que soavam os primeiros acordes dissonantes da Bossa Nova. Nas telas, filmes do Cinema Novo. Nos anos 50, com Juscelino Kubitschek na Presidência, o "Jornal do Brasil" lançou o Suplemento Dominical (1956), criado pelo poeta Reynaldo Jardim e que se transformaria no embrião do futuro Caderno B, quatro anos depois. Além de Jardim, nomes como Ferreira Gullar, Mário Faustino, os irmãos Augusto e Haroldo de Campos e Mário Pedrosa tiveram forte influência no Suplemento Dominical. Em 1959, fazia a sua reforma gráfica.

- O "JB" já chamava a atenção e prestígio intelectual, com o seu Suplemento Dominical, que trouxe uma nova noção estética concretista, misturando artes plásticas, literatura, ciência. No aspecto gráfico, Amílcar de Castro eliminou os fios, implantando a diagramação vertical e valorizando os espaços brancos das páginas - lembra Wilson Figueiredo, colunista do jornal. No suplemento cultural, liberdade de estilos

De fato, mais uma vez o "JB" lançava moda. O Caderno B foi o primeiro suplemento exclusivamente voltado para assuntos culturais, de entretenimento e variedades, pondo o Rio numa caixa de ressonância nacional. Mas a inovação do Caderno B não se restringia à forma gráfica. Os repórteres e colaboradores do suplemento tinham liberdade estilística em suas narrativas, dispensando os padrões de objetividade do texto jornalístico. Um dos nomes de destaque era Wilson Coutinho, crítico de arte. Além disso, o caderno aceitava colaboração de escritores, artistas e intelectuais.

- A reforma de 59 foi a mais duradoura da imprensa brasileira. Inspirada em padrões estéticos criativos, como o concretismo, antecipou tendências. Uma revolução no design, que inspirou os jornais sem fios - afirma Alberto Dines, do Observatório da Imprensa e ex-diretor de redação do "JB".

A diagramação ousada do "JB" tinha no Caderno B um de seus espaços privilegiados. Várias capas do suplemento entraram para a história do jornalismo brasileiro por seu arrojo. O destaque dado a fotos, ilustrações e infográficos, além da valorização de espaços em branco na página, realçava as reportagens.

Em entrevista ao "Jornal da ABI", o jornalista Carlos Lemos, então na editoria de Esportes, lembra que foi o primeiro a retirar os fios da diagramação, ideia de Amílcar de Castro, mas que ainda não havia sido implementada:

"O Amílcar defendia tirar os fios que separavam as colunas do jornal. Foi a brecha que eu tive para imprimir minha mudança. Fui à oficina, pedi para aumentar a medida entre as colunas e tirar os fios, responsabilizando-me por qualquer problema que acontecesse."

A importância do "JB" não se restringiu ao Rio de Janeiro. Apesar da transferência da capital federal para Brasília, o Rio continuava dando o tom na vida cultural e política do país e o jornal era um veículo que formava opinião, sendo lido religiosamente pelas classes política e artística e a intelectualidade. Perda de credibilidade foi o golpe de misericórdia

Flavio Pinheiro, ex-editor-executivo, lembra que o "JB" promoveu outras inovações na imprensa brasileira:

- Criou a primeira revista dominical, uma revista de programação de fim de semana, o caderno Idéias, o espaço para humor - enumera. O espaço dado à charge de Chico Caruso era um desses exemplos.

Mas, quando a capital fluminense entrou em processo de degradação, o "JB", com problemas financeiros, acompanhou e também começou a perder prestígio, lembra Pinheiro:

- Quando, anos atrás, morreu o grande jornal, morreu mais um pouco a altivez republicana e a presunção cosmopolita do Rio.

- A importância do "JB" foi imensa. Contando só os anos do jornal que vivi ou conheci, de meados dos anos 50 e aos anos 90, acho que todo jornal no Brasil queria de certa maneira ser o "JB". Mas isso passou há muito tempo. Ele é um jornal que se limitou a sobreviver nas últimas décadas. Cada vez que ele fazia um esforço para melhorar, ficava mais parecido com os outros jornais, porque sua fórmula original estava esquecida - afirma Marcos Sá Corrêa, ex-editor-chefe do "Jornal do Brasil".

Para alguns profissionais, no entanto, a crise acabou por afetar o principal patrimônio do "JB": a sua credibilidade.

- Antes da venda da empresa, mesmo com todos os problemas de gestão, o jornal tinha credibilidade, que sempre foi seu ativo mais precioso. Os novos donos não conseguiram ou não quiseram entender isso. A venda foi um golpe forte na credibilidade da marca, e depois dela a morte do jornal nas bancas tornou-se uma questão de tempo - diz Orivaldo Perin, ex-chefe de redação do jornal. - É uma morte ruim para todos, principalmente para os leitores. Em vez de fazer história, o "JB" vira história.

(Com a colaboração de Bruno Rosa)

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