Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Emprego não é prisão
Atenção, empresas. Um alerta - de maneira bem direta:
Vocês não são donas das pessoas que trabalham aí.
Portanto, vocês não têm poder sobre todos os caminhos que serão traçados nas carreiras delas, e não têm o direito de impedi-las ou de tentar restringir o acesso a oportunidades de trabalho e crescimento fora da sua organização.
Explicando:
Em nossa vida profissional, estamos acostumados a ouvir chefes, líderes e representantes de organizações dizendo algo como "os nossos funcionários", "os nossos colaboradores, "o meu time", "a minha assistente", "my precious" (rs) e por aí vai....
Em geral, sabemos que "nosso/nossa/meu/minha" são pronomes utilizados para facilitar a comunicação e indicar a posição das pessoas dentro das estruturas empresariais, com linha de comando e hierarquia.
Mas será que é só isso mesmo, "meus" amigos(as)?
Não. Infelizmente, não. Há líderes bem mais possessivos(as) do que esses pronomes, e existem empresas e chefes que pensam realmente ser donos do destino profissional dos funcionários.
A linha da construção dessa visão, muitas vezes, é sutil. Afinal, grande parte das organizações (ainda) acredita e repete que "os funcionários são o maior ativo de uma organização". No entanto, não aprofundam o pensamento sobre o que essa declaração realmente significa.
Vejamos... A definição contábil de "ativo" é: bens e direitos que pertencem a uma organização. Ou seja, há o vínculo de posse reconhecido. Inclusive, um ativo é algo que potencialmente poderá ser convertido em dinheiro para a organização.
Se você acompanha a minha coluna por aqui, imagino que não será necessário me alongar para que possamos compreender que pessoas não são bens nem direitos que podem ser convertidos em dinheiro para uma empresa, certo? (Certo, né?)
No entanto, como mencionei, nem todo mundo tem essa consciência. Aliás, é razoavelmente comum que organizações e líderes busquem acordos para que não haja oportunidades de trabalho para funcionários de uma empresa na outra. Sério.
Há algum tempo, a líder de RH de uma empresa me enviou um e-mail com conteúdo mais ou menos assim:
"Soube que algumas pessoas da minha equipe estiveram conversando com vocês sobre uma oportunidade de trabalho na sua organização. Uma vez que nós somos usuários dos serviços da sua empresa, gostaria de propor um acordo para que vocês não permitam que nossos colaboradores evoluam em seus processos seletivos sem contato prévio conosco e sem nossa autorização. Por exemplo, aqui, na nossa empresa, mesmo tendo necessidade de contratação acelerada, temos a política de não contratar profissionais de clientes e parceiros."
Como a mensagem foi enviada por uma profissional com quem sempre tive muito boa relação, eu recebi o recado como um convite à reflexão. Afinal, o assunto não é tão simples quanto parece.
A relação trabalhador-organização, pressupõe um nível de confiança em que as partes têm abertura para conversar e para buscar alternativas quando as coisas não vão bem. Infelizmente, sabemos que muitas vezes não é assim e que dificilmente conseguiríamos identificar qual ponta está deixando a relação enfraquecer, de fato.
Respondi ao email explicando meu ponto de vista sobre a solicitação e meu entendimento de que as pessoas devem ter o direito de explorar opções e conversar abertamente quando identificarem que a relação atual não está tão bem... Nunca recebi uma resposta.
Realmente acredito que precisamos atualizar a visão que temos sobre o papel das organizações. A meu ver:
Toda empresa deve ser uma plataforma para que você evolua em direção à sua melhor versão, como impulsionadora de desenvolvimento humano e construção de legado.
Nesse sentido, cada pessoa (líder ou não) terá uma interpretação sobre a qualidade da relação, devendo valorizar o contrato formal e psicológico estabelecido nessa construção e reforçando a transparência.
No entanto, não é isso que acontece. Muitos(as) profissionais abandonam repentinamente projetos em que tinham um papel relevante, sem comunicar previamente seus parceiros de trabalho, nem os(as) líderes. Partem para algo que julgam melhor, sem cautela em relação ao impacto que isso terá sobre as outras pessoas. E, claro, também existem chefes que demitem, "de surpresa", funcionários que nunca receberam nem sequer uma pista de que não estavam produzindo bem.
Tá errado isso aí.
Em diversos momentos da minha vida profissional, vi colegas, chefes e subordinados partindo para novas oportunidades de trabalho, de modo repentino. A saída desses(as) profissionais trouxe desafios para as organizações e para os times, sem dúvida. Inclusive para mim.
No entanto, acima de tudo, eu acredito que o papel do trabalho e das organizações é potencializar o desenvolvimento humano, a consolidação da identidade e o sentido de pertencimento, utilidade e realização. Toda pessoa tem o direito de buscar uma plataforma em que seja desafiada e onde possa maximizar sua contribuição.
Por isso:
Se outra organização tem uma possibilidade de trabalho que possa interessar a uma pessoa que está empregada na empresa onde você trabalha, você - gestor(a), líder, chefe, coordenador(a), carrasco, brother, ou o que você achar que é na relação empregado x empregador - NÃO tem o direito de restringir o acesso a essa oportunidade.
Em vez disso, que tal:
1. Criar uma relação saudável com as pessoas que trabalham com você, na qual haja confiança e não medo, com espaço para que elas conversem quando receberem propostas que julguem interessantes no mercado;
2. Buscar ativamente identificar como está a relação das pessoas com a organização: o que falta, o que sobra, o que é bom e o que poderia ser diferente;
3. Desenvolver a humildade e considerar que, talvez, realmente a empresa em que vocês trabalham não apresenta a melhor oportunidade para essa pessoa, nesse momento;
4. Demonstrar sempre (por meio de ações) a sua intenção positiva de ajudar o desenvolvimento das pessoas.
Para mim, trabalho é uma forma de amor. E, tanto no trabalho como no amor, a qualidade da relação não se sustenta pela posse.
Substitua as estratégias de controle pela construção de uma relação de confiança e de crescimento conjunto que trará muito mais leveza e felicidade.
Não é fácil. Exige maturidade e conversas difíceis. É papel da empresa e do trabalhador.
Acima de tudo, é o certo a ser feito. Experimente.
Você já perdeu alguma experiência, porque a chefia barrou sua movimentação?
Sabia que existe essa prática no mercado?
O que acha dessa questão?
Deixe aqui o seu comentário, ou me escreva em @pellaes no Instagram.
Um abraço e muito bom trabalho.
Lugares Incríveis para Trabalhar
O Prêmio Lugares Incríveis Para Trabalhar é uma iniciativa do UOL e da FIA para reconhecer as empresas que têm as melhores práticas em gestão de pessoas. Os vencedores são definidos a partir dos resultados da pesquisa FIA Employee Experience (FEEx), que mede a qualidade do ambiente de trabalho, a solidez da cultura organizacional, o estilo de atuação da liderança e a satisfação com os serviços de RH. A pesquisa já está na fase de coleta de dados das empresas inscritas e as empresas vencedoras devem ser anunciadas em agosto.
5 Comentários
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Amigo, a realidade é bem diferente do mundo idealizado deste texto. Quem contrata pode demitir simplesmente por que sim e acabou, não tem isso de papo psicólogo. Se precisar terapia vai no especialista. Confianza até um certo ponto; nunca você sabe o que passa na cabeça de quem é chefe, aliás por que ele fez o diabo para chegar aí e continua fazendo para subir mais... Não se confia na raposa... E se for embora?.... Bom, outro vira no lugar, ninguém é imprescindível, iso vale para qualquer um. Existe toxicidade em todas as relações trabalhistas, sempre foi e sempre será. Profissional é aquele que sabe reconhece isso e sabe como lidar.
Em um consorcio ativista politico, em que só há uma linha de pensamento, falar da liberdade individual passa do ridículo do que representam.